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[ sons, imagens e palavras nada recomendáveis, deveras pouco legíveis em telemóveis "inteligentes" ]
Quartet for the end of time, Olivier Messiaien
Na noite em que cheguei, destroçado
ao bar do costume
e contei a morte da minha amada
no dia anterior
estavam lá os três:
Ugur, que saiu para comprar flores
e me pediu para as levar
quando voltasse
ao lugar onde aquilo tinha acontecido
Asaf, que me deu mais tarde um desenho
e Behçet, o psiquiatra,
que se ofereceu para me ajudar
em relação à chamada “dor”.
Por acaso estavam de facto lá
nessa noite esses três
que dois anos mais tarde foram mortos
queimados em nome de Deus
por uma multidão de fanáticos.
As rosas secas
estão no porta-bagagens do meu carro
o desenho de Asaf
amarelece numa moldura na parede.
Quanto à dor
surpreende-me ter aprendido
essa palavra
há tantos anos
quando o que mais me atormentava
era o tédio.
Ugur, Asaf, Behçet, Henrik Nordbrandt, 1995
(em “Aqueles Que Têm Os Ossos Frágeis, nº 2”, 1999)
On that gusting day of the inauguration of the young emperor [J.F. Kennedy], the sublime Augustan moment of a country that was not just a republic but also an empire, no more a homespun vision of pioneer values but a world power, no figure was more suited to the ceremony than Robert Frost. He had composed a poem for the occasion, but he could not read it in the glare and the wind, so instead he recited one that many had heard and perhaps learned by heart.
"The land was ours before we were the land's.
She was our land more than a hundred years
Before we were her people."
This was the calm reassurance of American destiny that provoked Tonto's response to the Lone Ranger. No slavery, no colonization of Native Americans, a process of dispossession and then possession, but nothing about the dispossession of others that this destiny demanded. The choice of poem was not visionary so much as defensive. A Navajo hymn might have been more appropriate: the "ours" and the "we" of Frost were not as ample and multihued as Whitman's tapestry, but something as tight and regional as a Grandma Moses painting, a Currier and Ives print, strictly New England in black and white.
excerto de "The Road Taken", ensaio de Derek Walcott (uma terça parte de "Hommage to Robert Frost", de Joseph Brodsky, Seamus Heaney, e do citado Walcott, 1996)
Um par de prendas, Dezembro 2013
I took a trip (on a Gemini spacheship), The Legendary Stardust Cowboy
Quem dispara mais rápido do que a sombra? Quem sobe paredes como uma aranha? Quem caiu no caldeirão, hã, quando era mais pequeno? Quem tem o martelo de Asgard, tu? Quem tem um Batmobile? Quem tem uma caixa forte onde guarda a moeda nº 1? Quem voa por todo o universo? Quem tem o corpo de borracha? Quem tem uma plantação de amendoins, que o transforma em super-herói? Não esperes encontrar um velho de barbas sentado numa nuvem. Não esperes pelos extraterrestres. Não esperes satisfazer os teus desejos com nenhuma lâmpada de Aladino. Entra na clandestinidade. Quem tem um cão chamado Milú, tu? Quem tem um Marsupilami? Quem tem um cavalo chamado Silver e um índio chamado Tonto?
Clandestinidade (Corpo Diplomático, 1979)
Tudo por demais anacrónico: letra de música demasiado pop sobre excerto de desenho meu sobre gramática de Alemão, e no entanto...
I must be careful now in my steps / Years of calculations and the stress / My science is waiting / nearly complete / One glass will last for nearly a week // Let me not get down from walking with no one / And if I stumble from exhaustion / These buckets are heavy, I fill them with water / I could ask these people, but I shouldn’t bother // Oh no, I’ve stumbled, was I going too fast? / Some get angry, some of them laugh / They told me I wouldn’t, but I found an answer / I’m Van Occupanther! // Let me not be too consumed with this world / Sometimes I want to go home / and stay out of sight for a long time
Van Occupanther, Midlake, 2006
excerto de "Stardust Memories" (Allen, Woody, 1980)
Oh, que desgraça
mais versos sobre o início do mundo
(lamento?, é só o meu…)
Semana bem estranha
esta, do lado de fora
e aqui por dentro, também
O contínuo afastamento
de todas as órbitas demasiado percorridas
retido
Neste universo coberto de látex
(repito-o para ver se se rasga
Se dele nasce algo de novo)
claro que não, a sombra de um talvez apenas, mas
Nenhum dito, escrito, desenhado, pintado ou fotografado por mim
(agora me soa verdade...)
Foi mais gentil comigo do que eu
Traduziu Sagan num solarengo dia
«Estar siderado» significava no étimo
«sentir-se influenciado pelas estrelas»
Não faço a menor ideia disso
(a sério que não)
Quanto mais me aproximo do túnel
em cujo final
renascidos (?!)
Juram ter avistado uma luz branca
(redentora?!)
Enquanto o breu mais se abruma
Neste planeta
onde Sagan, tantos outros e agora um desgraçado Tyson
No seu discurso demasiado simplista
(para adolescentes retardados?!)
Entre a necessária colisão das partículas do mundo
para que
Entre o caos aparente e inevitáveis ruínas
presentes na natureza animal, humana e planetária
Surgindo fosse algo de novo
(uma réstea de beleza, subjacente a quase toda a criação?)
Mesmo que da derrota vizinho
empático hipócrita, diante da melhor
(parteno?)génese donde surgimos
O vislumbre apenas
de vodus idiotas para modernos aztecas
para Mayas, caramba!
E tantos outros “gurus dos actuais
Karambas”, de absolutos disparates
Diariamente debitados
durante o televisivo mambo-jambo
Não me considero
(tento não me desconsiderar)
Organizo eventos apenas meus
alheios de sortes mais públicas
Espaços, no seu mínimo, viznhos
entre exterior e interior
(azar o meu, decerto)
Ao lado, em cima como em baixo
Pouco mais do que absoluto breu
O sonho de ser astronauta? Sim, sendo fui
(banal com demasiada frequência)
Pura condescendência, o mais das vezes
(abandonei-o, ao sonho, bem cedo
Quando, algo tardias, me surgiram penugens na púbis
na face e na consciência de mim)
Subindo por essa escadaria
(genética, etária… a do sucesso pessoal, não é?)
Ficando se vai cada vez menos capaz de emitir surpresas
ou de reconhecer novidades.
Daí que
(isto não passa de posologia para mais ninguém senão eu)
Antes persistir, sempre de passagem
nesta cruz, comum com gente de carne e osso
Ainda com vísceras, se possíveis
Aí já cheguei, suponho
No máximo de tempo livre possível
preso ao tempo conseguindo fui muito pouco
Escalar nunca foi vocação
acima das nuvens, talvez
acima da estratosfera, suponho
É certa para mim
a existência de um breu medonho.
Ao contrário do que se pensa
não é pela lonjura
nem pelas limitações tecnológicas que
O espaço sideral é pouco frequentado
antes por lá haver muito pouco que valha a pena
Bués de matéria negra e pouco mais
Satélites, um exagero de satélites cuscos, e calhaus
Demasiados calhaus convencidos de que
Oh de que
Todos podemos ser astros
Sabem que mais?
(dissequem formigas, questionem neutrões e pouco encontrarão)
Pouco somos
pouco sempre mais fomos
pouco mais seremos?
talvez ainda menos do que
Heróis, quase nunca
prévios à heroína
quase não mais
do que apenas
Pó
Lençol a secar sobre grades (quintal materno, Dezembro 2013) + dois excertos da televisiva série "The Big Bang Theory"
Na-Arean estava só no espaço
Como uma nuvem que flutua no nada
Não dormia pois não existia o sono
Não sentia fome porque ainda não havia fome
Assim permaneceu durante longo tempo
Até lhe ocorrer um pensamento
Disse para si próprio
Vou fazer uma coisa
Lenda da ilha Maiana (arquipélago Kiribati, Oceano Pacífico),
que pretendia descrever a criação do Mundo
(numa epígrafe de Cosmos, Carl Sagan, 1980)
---º---
Após Anu ter criado o Céu
E o Céu ter criado a Terra
E a Terra ter criado os rios
E os rios terem criado os canais
E os canais terem criado o pântano
E o pântano ter criado o verme,
O verme apresentou-se a Shamash
Chorando lágrimas caídas diante Ea:
“O que me darás para comer e beber?”
“Dar-te-ei o figo seco e o damasco”
“E o que farei eu com o figo seco e o damasco?”
“Ergue-me e entre dentes e gengivas deixa-me habitar”
“Porque disseste isso, ó verme?
Que Ea te destrua com a força da sua mão!”
Fórmula mágica contra o verme que os Assírios, c. 1000 a.C.,
julgavam causar a dor de dentes (in Cosmos, Carl Sagan, 1980)
---º---
Há uma coisa de forma confusa, nascida antes do Céu e da Terra
Silenciosa e vazia, está só e nunca muda
Gira e não se cansa - talvez seja a Mãe do Mundo
Ao certo, não sei qual o seu nome
Por isso, chamo-lhe O Caminho - a título provisório, O Grande
Sendo grande, pode dizer-se que está a recuar
Recuando, pode dizer-se que é longínquo
Sendo longínquo, pode dizer-se que está a regressar
excerto de Tao Te Ching, Lao-Tzu, c. 600 a.C.
(numa epígrafe de Cosmos, Carl Sagan, 1980)
---º---
Um viajante ocidental encontra um filósofo oriental e pede-lhe que descreva a natureza do mundo:
- É uma grande bola descansando na casca da tartaruga do mundo.
- Mas onde se apoia a tartaruga do mundo?
- Nas costas de uma tartaruga ainda maior.
- E essa, onde se apoia?
- É uma pergunta muito pertinente, mas não vale a pena. Há tartarugas em toda a parte.
excerto de Broca’s Brain, Carl Sagan, 1979
---º---
Kepler publicou, em 1606, um livro chamado “De Stella Nova” (Da Nova Estrela), onde divaga sobre a possibilidade de uma supernova resultar da concatenação fortuita de átomos nos céus. A certa altura, apresenta o que diz ser “não a minha opinião, mas a da minha mulher: ontem, cansado de escrever, fui chamado para jantar uma salada que lhe tinha pedido. Parece, disse eu, que se os pratos de estanho, folhas de alface, grãos de sal, gotas de água, vinagre, azeite e rodelas de ovo andassem a voar pelo ar por toda a eternidade, poderia finalmente acontecer, por acaso, que se transformassem numa salada. Sim, respondeu a minha querida mulher, mas não tão boa como esta que eu fiz.”
num rodapé de Cosmos, Carl Sagan, 1980
Indícios?, por demais
um tremendo cansaço
de coisas feias, e daí
sons, diversos traços
caracteres alguns
de um rasto só
Algum tempo:
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Algumas pessoas:
T ; José Carvalho da Costa, Francisco Q ; Alcino V, Vitor P ; José Carlos T, Fernando C, Eduardo F ; Paulo V, "Suf", Zé Manel, Miguel D, S, Isabel, Nancy ; Zé T, Marcelo, Faria, Eliana ; Isabel ; Ana C ; Paula, Carlos, Luís, Pedro, Sofia, Pli ; Miguel B ; professores Manuel João, Rogério, Fátima Marinho, Carlos Reis, Isabel Almeida, Paula Morão, Ivo Castro, Rita Veloso, Diana Almeida
Outros que, no exacto antípoda dos anteriores, despertam o pior de mim:
Demasiados. Não cabem aqui. É tudo gente discursivamente feia. Acendendo a TV ou ouvindo quem fora dela reproduz agendas mediáticas, entre o vómito e o tédio a lista tornar-se-ia insuportavelmente longa.
Uma chave, mais um chavão? A cultura popular do início deste séc. XXI fede !
joseqcarvalho@sapo.pt
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