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De quando em vez (2)

por JQ, em 11.10.14

Para além da última, há pelo menos outra "coisa" em comum entre casas, computadores e pessoas: memórias profundas e outras temporárias. Sendo as primeiras de conservar, já as segundas precisam, de quando em vez, de alguma higiene, para que o caminho por entre elas não se torne demasiado lento. Há uns tempos, quando me considerava mais humano, apanhava dois ou três pifos valentes por ano e, na tarde do dia seguinte, este fígado cor de cinza que carrego entre os ombros parecia bem mais leve de memórias, bem mais pronto para reinícios. Com o mesmo objectivo, elimino os ficheiro temporários do computador meia dúzia de vezes ao ano. Quanto aos papéis nas gavetas de casa, sou bem mais preguiçoso. Nem anualmente acontece uma “limpeza da Páscoa”. Bom, nesta última encontrei uma folha A4, já amarelecida pelo mofo decorrido desde o tempo das rádios piratas, em que me terá servido, como neste blog, de pausa entre músicas. Achei-lhe alguma graça e por isso transcrevi-o para aqui. Tinha um título tão juvenil quanto a noção de conjugalidade, simultaneamente ingénua e céptica, como eu ainda, nela subjacente:

 

 

Fanáticos da verdade? Viciados no strip emocional? Tomem lá um pouco de ficção!

 

Foi assim ou mais ou menos. Era já bem tarde quando cheguei a casa, vindo do Quartel-General. Enquanto despia a farda, calhou reparar que a minha de carnes generosa esposa e um franzino tipo qualquer esperneavam felizes na alcatifa. Discretíssimo, como quase sempre, fui à arrecadação, empunhei o Black & Decker e fiz o que tinha a fazer. Dois queriam ser um?! A bem dizer, ficaram ambos definitivamente feitos num oito.

 

Após, subi ao quarto dos meus filhos e risquei da memória cinco anos de insónias e dores de cabeça, vezes mil vezes a cor e o cheiro das fraldas que precisaram. Bom, enchi uma mala e mudei de cidade. Havia séculos que não me sentia tão bem. A partir daí, sempre que precisava disso, dava as minhas voltas, serial e humildemente contribuindo para diminuir a taxa de pouca-vergonha.

 

Num dia qualquer – primaveril, decerto -, levantei a cabeça e reparei que todas as morais estavam de rastos. Convenci algumas pessoas disso e fomos tomando umas quantas medidas para resolver o problema. Chegamos ao ponto de premir alguns botões vermelhos, daqueles capazes de fazer crescer magníficos cogumelos detergentes. Tudo foi varrido, excepto eu e um baú pleno do adn de inúmeros bichinhos. Uf-uf, suspirei de alívio e adormeci...

 

… Para ser acordado por dois estorninhos numa tarde outonal como esta. Ergui o olhar e, lá no alto, o que vi eu? O voo alcoólico dum ovni em forma de frigideira, donde foi despejada uma moça realmente saudável. Deveras mesmo. Não me rendi logo, mas ela, em mim, serviu-se de todos os truques encriptados no seu software de origem.

 

Alguns dias passados, conhecemo-nos no sentido bíblico. Fomos muito felizes durante 949 anos. Eu, ela, umas frangas e ovelhitas de quando em vez. Uma semana antes de atingir a idade de Noé, os céus e as terras fartaram-se de nós, pecadores, e disseram-nos adeus. E todos nós dissemos adeus uns aos outros e a um todo que nunca foi nosso.

 

Bom, podia ter sido bem pior, ou, quem sabe?, talvez melhor. Parecendo que sim, desconfio que os profetas do mais sonoro saber nunca experimentaram a ponta do menor corno da realidade. E daí, talvez tenham desistido de sonhar. Será que alguém, ainda…?

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Alguns riscos


Indícios?, por demais

um tremendo cansaço

de coisas feias, e daí

sons, diversos traços

caracteres alguns

de um rasto só


Algum tempo:


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Outros que, no exacto antípoda dos anteriores, despertam o pior de mim:


Demasiados. Não cabem aqui. É tudo gente discursivamente feia. Acendendo a TV ou ouvindo quem fora dela reproduz agendas mediáticas, entre o vómito e o tédio a lista tornar-se-ia insuportavelmente longa.


Uma chave, mais um chavão? A cultura popular do início deste séc. XXI fede !


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